
Desnível

DESNÍVEL
Radicada em São Paulo, a artista paranaense Viviane Rosa desenvolve, ao longo de mais de uma década de trajetória, uma pesquisa escultórica profundamente ancorada nas relações entre corpo, memória e matéria. Sua prática atravessa a tridimensionalidade com gestos que transgridem convenções da escultura tradicional, ao incorporar materiais não clássicos — nem mármore, nem argila, tampouco bronze —, mas uma massa inventada, moldável e simbólica, com a qual articula novos códigos de coexistência.
Na exposição Desnível, Viviane propõe um deslocamento perceptivo que tensiona as fronteiras entre o corpo e o objeto escultórico. Suas obras instalam-se no espaço como presenças que não apenas o ocupam, mas o ativam e reorganizam, instaurando um campo de forças em que o equilíbrio é sempre precário, sempre em suspensão. Fixidez e instabilidade, rigidez e maleabilidade, matéria tangível e fabulação coexistem no jogo de contrastes.
A artista investiga, por meio de composições formais e simbólicas, a dualidade entre o físico e o imaginado. Elementos como varas de inox que se erguem até o teto operam como vetores verticais de tensão — não estruturas meramente estáticas, mas pontos de encontro entre gesto, intenção e acaso. Sapatos deslocados de sua funcionalidade original surgem como vestígios de passagens: marcas de corpos ausentes, corpos que já se foram ou que ainda não chegaram. Nessas peças, o movimento se insinua mesmo na imobilidade, instaurando camadas de leitura que transformam a literalidade dos materiais.
A noção de desnível presente no título da mostra emerge tanto como metáfora quanto como referência afetiva: remete à memória de infância da artista e à figura paterna, por meio do uso de mangueiras com água — instrumentos simples para aferir o nível em construções caseiras. Esse gesto cotidiano, carregado de afeto e empirismo, desdobra-se aqui como estratégia poética para pensar a instalação não mais como forma fixa, mas como um campo expandido de relações sensoriais e subjetivas adquiridas no espaço pelo material líquido que equilibra o ambiente.
Viviane Rosa opera no entre-lugar da criação como investigação. Suas obras configuram-se como enunciados plásticos que recusam a normatividade formal e reivindicam criador e criatura como ato de conhecimento. Mais do que objetos, suas esculturas são estados de presença — invenções que nos convocam a repensar os limites do visível, do palpável e do habitável no espaço expositivo.
Desnível não é apenas título, mas uma proposição: é a ideia de escultura como deslocamento, como construção de mundos, de outros corpos, como inflexão entre o que é e o que pode vir a ser. Nesse campo expandido, a artista reinscreve o gesto escultórico como linguagem em ação — capaz de revelar e ocultar, de afirmar e suspender, de tocar e experimentar a relação com seus suportes.
Curadoria de Fabiano Fernandes
Atelier Galeria FFAC
Individual Vivi Rosa
Agosto - 2025
Porto - Portugal
















